segunda-feira, 31 de março de 2014

Coronel reformado depôs sobre a Casa da Morte de Petrópolis à Comissão Nacional da Verdade

Segundo os periódicos Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo, o coronel reformado Paulo Malhães foi intimado pela Polícia Federal a prestar depoimento à Comissão Nacional da Verdade (CNV), referente à ocultação dos restos mortais de vítimas do regime militar (1964-1985). Malhães relatou que as vítimas da chamada Casa da Morte de Petrópolis, na cidade do Rio de Janeiro, eram mutiladas e jogadas no rio. De acordo com o coordenador da CNV, Pedro Dallari, o coronel afirmou que o Ministério do Exército possuía conhecimento dos acontecimentos em Petrópolis, contrariando a versão “sempre repetida por militares, de que as violações de direitos humanos decorriam de excessos de alguns agentes". Na década de 1990, o ex-sargento Marival Chaves, que também atuou na Casa da Morte, afirmou que os corpos das vítimas eram “esquartejados e enterrados aos pedaços”, divergindo do relato de Malhães. No primeiro depoimento, o coronel reformado assumiu participação na operação que levou ao desaparecimento dos restos mortais do ex-deputado federal Rubens Paiva. De acordo com a Folha, estima-se que até 24 presos políticos tenham morrido na Casa, local que foi mantido pelo Exército de maneira clandestina. O Estado afirmou que o coronel foi responsável, em 1970, pela "operação limpeza" que tinha como objetivo desaparecer com os corpos dos militantes de esquerda mortos na Guerrilha do Araguaia (1972-1974). De acordo com Malhães, os procedimentos seguidos foram os mesmos utilizados para o desaparecimento de opositores do regime militar em áreas urbanas. Além disso, o coronel reformado depôs sobre sua atuação no Centro de Informações do Exército (CIE). Num primeiro momento, o depoimento foi recolhido em sua própria residência, onde ele recebeu uma integrante e um assessor da CNV. Em dois encontros foram recolhidas 17 horas de depoimento. Para o presidente da Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro, o advogado Wadih Damous, só será possível testar a veracidade do depoimento de Malhães caso o Estado brasileiro se pronuncie oficialmente a respeito. Durante o depoimento, Malhães afirmou que o coronel do Exército Freddie Perdigão foi o responsável pelo assassinato do jornalista Alexandre Von Baumgarten, morto a tiros e cujo corpo foi jogado no mar. O jornalista fazia parte da “Operação O Cruzeiro”, orquestrada pelo Serviço Nacional de Informações (SNI), objetivando melhorar a opinião pública em relação ao governo. Baumgarten “atuava à frente da revista a mando do SNI, que se encarregava de extorquir publicidade para a publicação e lhe dar dinheiro diretamente. O novo O Cruzeiro não resistiu ao fracasso editorial, e Baumgarten, sob ameaça, foi obrigado pelo SNI a vendê-lo”. De acordo com a O Estado, no depoimento à CNV, realizado no dia 25/03/14 no Arquivo Nacional, Malhães recuou dizendo que não se livrara do corpo de Paiva, por ter sido designado para outras tarefas. Malhães foi questionado por Dallari sobre abusos sexuais cometidos contra presas políticas, revelando que “se houve, foi um ou dois casos”, mas que ele nunca cometeu. Para José Carlos Dias, integrante da CNV, “foi um depoimento importante. Ele acabou por reconhecer que é um torturador. Poucas vezes tivemos a confissão de um torturador como ele fez, justificando que tinha que torturar um inimigo”. Segundo a Folha, Dallari afirmou, no entanto, que as declarações de Malhães não serão aceitas isoladamente, pois o colegiado não procura formar convicções com base em apenas uma fonte, ainda mais considerando o fato do coronel reformado ter “oscilado muito no que relata”. De acordo com Dallari, o general reformado José Antonio Nogueira Belham, convidado a depor no dia 01/04/14 na Câmara dos Deputados, poderia auxiliar no esclarecimento das contradições apresentadas no depoimento de Malhães. Segundo O Estado, diante do depoimento de Malhães, a Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro declarou, no dia 26/03/14, que estuda uma forma de recorrer à Justiça para que o Exército colabore compulsoriamente com as investigações sobre o paradeiro de desaparecidos políticos. No caso específico do desaparecimento de Paiva, Damous afirmou que “o Exército tem que vir a público e esclarecer o que aconteceu. Não é pedir documento A, B, C ou D. É de se presumir que não haja mais documento. Agora é fazer pergunta direta: o corpo de Rubens Paiva foi jogado no rio?”. De acordo O Estado, o procurador da República Sérgio Suiama, integrante do Grupo de Trabalho Justiça de Transição, afirmou que o Exército, além de demorar, fornece informações incompletas ou contraditórias ao que havia informado. Segundo Suiama, não se espera mais ter o paradeiro de presos políticos, “o que a gente gostaria é que o Exército cumprisse a lei e fornecesse as informações requeridas”. (Folha de S. Paulo – Poder – 22/03/14; Folha de S. Paulo – Poder – 26/03/14; Folha de S. Paulo – Poder – 26/03/14; Folha de S. Paulo – Poder – 27/03/14; O Estado de S. Paulo – Política – 24/03/14; O Estado de S. Paulo – 25/03/14; O Estado de S. Paulo – Política – 25/03/14; O Estado de S. Paulo – Poder – 26/03/14; O Estado de S. Paulo – Política – 27/03/14)


DIDA SAMPAIO/ESTADÃO. Depoimento. Coronel da reserva Paulo Malhães (à dir.) é ouvido por duas horas durante sessão da Comissão Nacional da Verdade realizada ontem no Rio. O Estado de S. Paulo, São Paulo 26 març.2014 pag 8.

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