quarta-feira, 19 de junho de 2013

Discussões sobre a Lei da Anistia



Segundo o jornal Folha de S. Paulo, juristas brasileiros tem opiniões divididas acerca da Lei da Anistia (1979), reafirmada pelo Supremo Tribunal Federal em 2010. A questão ganhou destaque nos últimos meses devido à intenção, por parte de alguns integrantes da Comissão Nacional da Verdade (CNV), de incluir no relatório final um pedido de revisão da lei, que permitiria a punição de militares envolvidos em casos de desaparecimento, tortura e morte durante o regime militar (1964-1985). Renan Quinalha, mestre em Sociologia do Direito, apontou que outro fator que tem fomentado a questão da revisão é a estratégia adotada pelo Ministério Público Federal de apresentar denúncias contra militares com base na figura jurídica do chamado crime de natureza permanente, em que atos ilícitos praticados no passado ainda estão em curso, como por exemplo os  desaparecimentos.  Para Quinalha, "ainda que haja mais derrotas do que vitórias, [essa tática] serve para colocar a matéria em pauta e eventualmente criar jurisprudência". O periódico relembrou que, em 2010, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA), condenou o Brasil a punir os responsáveis pelo desaparecimento de 62 pessoas que participaram da Guerrilha do Araguaia (1972-1974). Os juízes da Corte alegaram que "as disposições da Lei da Anistia brasileira que impedem a investigação e sanção de graves violações de direitos humanos são incompatíveis com a Convenção Americana [da qual o Brasil é signatário]". O professor emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Dalmo Dallari, afirmou que "a OEA estabeleceu que não há anistia para crimes contra a humanidade nem autoanistia. Como os militares ainda estavam no comando quando a lei foi promulgada, ela não tem valor jurídico". Entretanto, o professor emérito da Universidade Mackenzie, Ives Gandra, discorda da revisão da lei e afirma “as cortes internacionais só funcionam nos casos de omissão da Justiça local. A nossa Constituição determina que lesões de qualquer natureza sofridas aqui devem ser levadas a tribunais brasileiros. E o STF já definiu sua interpretação”. Além disso, para ele a tese de crime de natureza jurídica permanente é apenas um “ficção jurídica”. De acordo com o periódico Correio Braziliense, a Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva (CV-SP) posicionou-se, no dia 10/06/13, favorável à revisão da Lei da Anistia (1979). A moção de apoio ocorreu durante um debate público sobre o não cumprimento da sentença do CIDH.  A viúva de Maurício Grabois, ex-dirigente do Partido Comunista Brasileiro, Crimeia Schmidt de Almeida, ressaltou que "a conquista dessa sentença tem uma grande abrangência, pois não se limita aos desaparecidos políticos no Araguaia, mas em todo o Brasil, e exige a punição dos torturadores". A sentença da CIDH foi lançada em formato de livro pela CV-SP, com 3 mil exemplares que serão distribuídos gratuitamente. A coordenadora da CNV, Rosa Maria Cardoso destacou que "se lermos com atenção, vamos compreender e pensar melhor a respeito da primazia dos direitos humanos diante da soberania e da prepotência de qualquer Estado”. Cardoso ainda demonstrou que, “a cada dia, surge uma Comissão ou comitê novo pela verdade". O jurista Fábio Konder Comparato ressaltou que no direito internacional não há anistia para crimes contra a humanidade, como tortura ou desaparecimento forçado de pessoas, sendo o Brasil o único país sul-americano com esta prática. O procurador da República Marlon Alberto Weichert argumentou que a única forma de validar a Lei da Anistia brasileira é o Estado se desligar dos órgãos que o condenaram, como a CIDH: "Teríamos que sair do sistema interamericano de direitos humanos, o que nenhum país latino-americano fez. Seria um absurdo e ainda teria efeito pouco prático, pois não haveria influência nas decisões já proferidas.". O atual ministro do STF, Luís Roberto Barroso, afirmou que a Lei da Anistia pode ser revista pela corte, que atualmente mudou sua composição, uma vez que quatro ministros, três dos quais foram favoráveis à manutenção da lei, se aposentaram. O periódico O Estado de S. Paulo destacou ainda que Rosa Maria Cardoso defendeu o cumprimento da sentença da CIDH e mencionou que o Brasil é contraditório por fazer parte de um organismo internacional e se recusar a cumprir as determinações. Por fim, o jornal informou que Cardoso mencionou que a CNV não possui uma posição definida quanto à anistia, e que tal discussão deverá ocorrer ao fim de seus trabalhos, quando serão debatidas recomendações ao Estado. (Correio Braziliense – 11/06/13; Folha de S. Paulo – Poder – 10/06/13; O Estado de S. Paulo – Política – 11/06/13)

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