quinta-feira, 24 de maio de 2012

A reação dos militares com a nomeação dos membros da Comissão da Verdade

MOTTA, Fábio/AE. Militares reagem à declaração de que investigação não tem dois lados.  O Estado de S. Paulo, São Paulo, 25 jan. 2007
Em coluna opinativa do jornal O Estado de S. Paulo, do dia 12/05/12, o general e ex-chefe de Estado-Maior Romulo Bini Pereira afirmou que a Lei da Anistia (1979) foi aprovada para promover a conciliação entre dois grupos opostos e “criou um pacto de reciprocidade para a reconstrução democrática no Brasil”. Segundo Bini Pereira, as Forças Armadas cumpriram com o seu papel de forma impecável, mantendo-se em silêncio, sem interferir no processo político. Entretanto, afirma que em 2012 “dois fatos vieram de encontro à atitude das Forças Armadas”. O primeiro deles é a criação da Comissão da Verdade, que é, para os militares, um modo de revanchismo. Segundo Bini Pereira, os trabalhos deveriam analisar também o ideário político-ideológico dos militantes de esquerda, que previam a instauração de uma “ditadura do proletariado”, e os métodos de luta armada, para que não se faça uma análise unilateral. O segundo fato, segundo o general, foi o incidente ocorrido no Clube Militar, na cidade do Rio de Janeiro, na ocasião das comemorações de aniversário da tomada de poder pelos militares, quando o prédio foi cercado por manifestantes que, segundo o general, “foram insultados e agredidos por uma turba de radicais com atitudes e impropérios usados pelos grupos extremistas das décadas de 60 e 70”. O protesto seria um sinal de que o ódio ideológico e o fanatismo estão novamente presentes no país, como na época do regime militar (1964-1985). Para o general, a concórdia e o entendimento foram “atitudes adotadas somente pelas Forças Armadas” e os “seguimentos minoritários”, ou seja, os militantes da esquerda da época do regime militar, não teriam assumido seus erros, talvez para se colocarem como heróis numa nova História, ou para legitimar o pagamento de 20 mil indenizações. O general questiona qual teria sido o destino do Brasil caso o “ideário radical dessa minoria” tivesse alcançado o poder e lembra que os fatos ocorridos durante o regime militar estavam inseridos no contexto da guerra fria, quando “os extremistas foram banidos em todo o mundo em razão de seu objetivo totalitário e único: a ditadura do proletariado”. Destaca ainda que os militares não querem defender a indisciplina ou quebra dos princípios democráticos, mas que a palavra dos chefes militares faz-se necessária para estabelecer um contraponto a atitudes deletérias tais como o incidente no Clube Militar.  O general afirma que ao ler artigos e manifestos dos militares da reserva percebe que a autoestima militar está em declínio, somada a outros fatores, tais como os baixos salários dos soldados da ativa e finaliza dizendo que a lei do silêncio dos militares deve ser quebrada e que “possíveis perturbações ou rupturas em nossas Forças trarão repercussões indesejáveis para o nosso país”. De acordo com o periódico Correio Braziliense, os militares da reserva preparam ações para se contraporem aos trabalhos da Comissão da Verdade. Na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, os clubes militares já afirmaram que criarão comissões paralelas, nos moldes da comissão federal, que tem por intuito acompanhar as investigações da Comissão da Verdade e produzir relatórios próprios. A intenção, segundo o presidente do Clube Naval, almirante Ricardo Veiga Cabral, é investigar crimes ocorridos contra militares e suas famílias durante o regime militar. Segundo o almirante, os membros escolhidos para compor a Comissão “têm uma ligação extrema com a esquerda e isso pode desequilibrar os resultados”. Já na cidade de Brasília, no Distrito Federal, militares da reserva tentam, por meios jurídicos, assegurar aos convocados a depor junto à Comissão o direito constitucional de não se manifestarem. O coronel da reserva Pedro Ivo Moezia prepara um mandado de injunção para que não ocorram punições futuras resultantes dos trabalhos da Comissão. De acordo com O Estado de S. Paulo, o almirante Veiga Cabral declarou que a comissão interclubes, formada pelos clubes Naval, Militar e da Aeronáutica, acompanhará as reuniões da Comissão da Verdade. Cabral defende que ambos os lados envolvidos em disputas durante o regime militar sejam investigados, afirmando que “não podem fazer como na Argentina. Se houver retaliação, vamos regredir. Estamos em um estágio de civilização muito avançado. Não é esquecer o passado. Já que querem retomar a história, que seja imparcial, observado o contexto da época”. Além disso, o Clube Naval já criou uma comissão própria, que pretende analisar os debates da Comissão da Verdade e prestar orientação jurídica e acompanhamento nos depoimentos a militares que forem chamados a depor. Veiga Cabral destacou ainda que a comissão paralela poderá “evoluir para um diálogo com a Comissão da Verdade, ou pelo menos com alguns integrantes dela, para ouvirem nossas justificativas”, pois a preocupação dos militares é a de que os trabalhos desenvolvidos sejam apenas uma estratégia para revogarem a Leia da Anistia. Veiga Cabral afirmou ainda que os militares da reserva devem servir como voz daqueles que estão na ativa e não podem se expressar para não ferir o Código Disciplinar, daí viria a importância das comissões próprias e da expressão através de artigos como o do general Bini Pereira. Por outro lado, segundo a Folha de S. Paulo, apesar do temor de “revanchismo”, os militares reagiram de forma discreta ao anúncio dos integrantes da Comissão, demonstrando somente a preocupação de que os trabalhos acabem na possibilidade de revisão da Lei da Anistia, o que, segundo eles, pode ser fomentado pela ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário. Alguns militares mostraram-se descontentes com a escolha a advogada Rosa Maria Cardoso da Cunha que, por ter defendido a presidente da República, Dilma Rousseff, no período do regime militar, não teria condições de atuar com imparcialidade no desenvolvimento dos trabalhos. De acordo com O Estado, os militares acreditam que a escolha de Cunha demonstra uma intenção de Rousseff em fazer militância política.  Militares da reserva como o general Luiz Cesário da Silveira, general Maynard Santa Rosa fizeram duras críticas à Comissão, classificando-a como “facciosa” e “fadada ao fracasso total”. O general da reserva Marco Antônio Felício da Silva declarou que nenhum militar deve se apresentar para depor à Comissão da Verdade, por existir a possibilidade da Comissão atuar de forma unilateral, e por ela buscar a comprovação de uma nova história, colocando os militantes armados “como democratas e defensores da liberdade e dos direitos humanos quando, no passado, desejavam a derrubada do governo e a instalação de uma ditadura do proletariado por meio da luta armada, usando do terrorismo, assassinatos, roubos, sequestros e justiçamentos”.  Ainda de acordo com O Estado, os ex-presidentes do Clube Militar, generais Gilberto Figueiredo e Luiz Gonzaga Shroeder Lessa, declararam, em reação ao discurso do diplomata Paulo Sérgio Pinheiro – que afirmou não existirem dois lados nos trabalhos da Comissão, apenas o lado das pessoas que sofreram violações de direitos humanos –, que se a Comissão só tem um lado é porque Pinheiro é “tendencioso e a avaliação dele será parcial, o que compromete seu trabalho, que deveria ser isento”. Em entrevista concedida ao jornal O Estado, o general da reserva Leônidas Pires Gonçalves, que atuou como ministro do Exército durante o governo do ex-presidente da República, José Sarney (1985-1990) afirmou que a presidente Rousseff deveria parar de olhar o passado e começar a olhar para o futuro do país, pois a Comissão da Verdade é “uma moeda falsa, que só tem um lado”, disse que os militares estão sendo injustiçados, uma vez que, atualmente, não há ninguém que os defenda dentro do governo, pois quando Nelson Jobim era ministro da Defesa ao menos existia um interlocutor. Para Pires o atual ministro, Celso Amorim, que deveria manifestar-se a respeito da Comissão, não o faz porque está ligado ao problema. O general mostrou-se indignado com a “injustiça que está sendo feita com o Exército” e que a Força está sendo “sumariamente julgada e punida”.  Entretanto, o general defendeu a liberdade de expressão e pediu que sua opinião fosse respeitada, disse que independente de não haver punição aos militares, o Exército já está tendo seu conceito abalado, e espera que os comandantes militares estejam levando a insatisfação dos oficiais com a Comissão da Verdade aos integrantes do governo. Ainda segundo Pires, os comandantes das três Forças devem orientar os militares que forem convocados à Comissão a como se comportar. Todavia, o general acredita que não será convidado a depor na Comissão, pois nunca ninguém alegou ter sido torturado, durante o período em que esteve vinculado ao Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) do estado do Rio de Janeiro. Por fim, rechaçou qualquer possibilidade de revogação da Lei da Anistia e que “se quiserem fazer pressão no Supremo, o poder moderador tem de entrar em atuação no país”. De acordo com a Folha, os comandantes do Exército, Enzo Peri, da Aeronáutica, Juniti Saito, da Marinha, Julio Soares de Moura Neto e o chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas, general José Carlos de Nardi, estiveram presentes no dia 16/05/12 na solenidade de posse dos membros da Comissão da Verdade. Segundo o jornal, os comandantes acompanharam a cerimônia com discrição e sem interagir com outras autoridades, e foram embora do local assim que o discurso de Rousseff terminou.  (Correio Braziliense – Política – 12/05/12; Folha de S. Paulo – Poder – 12/05/12; Folha de S. Paulo – Poder – 17/05/12; O Estado de S. Paulo – Nacional – 12/05/12; O Estado de S. Paulo – Espaço Aberto – 12/05/12; O Estado de S. Paulo – Nacional – 14/05/12; O Estado de S. Paulo – Nacional – 15/05/12; O Estado de S. Paulo – Nacional – 16/05/12; O Estado de S. Paulo – Nacional – 18/05/12)

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