quinta-feira, 24 de maio de 2012

Jornais opinam sobre alcance dos trabalhos da Comissão da Verdade

Diante do anúncio dos membros da Comissão da Verdade os jornais divulgaram várias colunas de opinião e editorial sobre diversos pontos relacionados principalmente com a escolha dos nomes feita pela presidente da República, Dilma Rousseff, a função dos trabalhos a serem desenvolvidos pela Comissão na investigação das violações aos direitos humanos e a possibilidade da revisão da Lei da Anistia de 1979. Em editorial da Folha de S. Paulo, no dia 12/05/12, o jornal classificou como legítima e equilibrada a composição dos membros da Comissão, que estariam ideologicamente vinculados com as “forças protagonistas da democratização”. O jornal chamou a atenção para as manifestações militares sobre a possibilidade de revisão da Lei de Anistia, mas lembrou também que a própria lei de criação da Comissão prevê que as atividades “não terão caráter jurisdicional ou persecutório”. Defendeu ainda que, embora os militares classifiquem as ações como atos de “revanchismo”, a sociedade brasileira tem o direito de conhecer seu passado. Finalmente, classificou que a Comissão da Verdade e a Lei de Acesso à Informação “representam um aprimoramento institucional valioso, que assegura e amplia o acesso da sociedade a dados sob a guarda do poder público”. Ainda no dia 12/05/12, em coluna opinativa da Folha, o jornalista Fernando Rodrigues afirmou que as recentes medidas que vêm sendo tomadas por Rousseff têm como intuito promover uma imagem sólida sobre suas convicções. Dentre essas medidas está a nomeação dos membros da Comissão da Verdade que, a estar marcada para o mesmo dia em que entra em vigor a Lei de Acesso à Informação, caracterizam um momento na qual a presidente tem feito “apostas relevantes”, nas quais Rousseff “será julgada pelos resultados de suas promessas”. Para Rodrigues, com a entrada em vigor da Lei de Acesso à Informação e se a Comissão da Verdade for capaz de “passar a limpo a história recente”, o país terá um grande ganho institucional. Em coluna opinativa do mesmo jornal, no dia 13/05/12, a jornalista Eliane Cantanhêde evidenciou o conformismo dos militares em relação à composição da Comissão da Verdade. Para ela, a reação militar consiste agora apenas na dúvida da utilização da Comissão para fomentar o desejo de produção de ações penais aos militares da época do regime militar (1964-1985). Assim, a Comissão funcionaria como canal para “catequizar” a população da necessidade de se revogar a Lei da Anistia, pois a tortura é considerada crime imprescindível. No geral, considerou os nomes dos escolhidos para a Comissão como pessoas experientes, equilibradas e nada radicais. Em coluna do jornal O Estado de S. Paulo, no dia 13/05/12, destacou-se que a criação da Comissão da Verdade não expressa um ponto de partida para o “acerto de contas” com os militares que atuaram no regime militar, mas sim um fechamento para concretizar, com os fatos realmente esclarecidos, o fim de uma trajetória. O jornal elogiou Rousseff na condução do processo de criação e nomeação do grupo, que foi constituído com discrição e como um órgão do Estado e não de um governo. Além disso, foram excluídos quaisquer indivíduos que ocupem cargos executivos em partidos políticos e ficou estabelecido que ninguém será obrigado a depor. O jornal destacou também que os militares que aceitarem contribuir com os trabalhos, seja com depoimentos ou documentos, terão ampla oportunidade de dar a sua versão dos fatos ocorridos, além de estarem resguardados de possíveis julgamentos segundo a Lei da Anistia. Em coluna opinativa, o Correio Braziliense, no dia 13/05/12, além de elogiar a escolha dos membros da Comissão, destacou a fala de Rousseff na qual a presidente afirmou que a instauração da Comissão  interessa não somente àqueles que  viveram sob o regime militar, mas principalmente às novas gerações que     “tiveram a oportunidade de nascer e viver sob o regime democrático (...) e devem saber que a liberdade é preciosa”.  O jornal ainda resaltou que conhecer a história de um país tem uma função civilizatória, na qual se conhece os erros do passado para que não voltem a se repetir. Finalmente, lembrou que as Forças Armadas, como instituição, não tem nada a temer com a implantação da Comissão, somente se preocupam os indivíduos que praticaram prisões ilegais, torturas, homicídios e ocultação de cadáveres. Em contrapartida, em coluna opinativa da Folha, no dia 14/05/12, o jornalista e cientista social Vinícius Mota alertou para a possibilidade de ocorrer perseguição aos envolvidos com o regime militar, falando do tratamento dado aqueles que participaram de regimes autoritários e foram condenados à “danação histórica”. Segundo Mota a “verdade histórica, em certa medida, está sempre em disputa, pois reflete o embate entre grupos que tentam contá-la no presente”. Dessa forma, o governo petista tenderia a realçar o papel das organizações radicais que atuaram na clandestinidade buscando “uma conciliação difícil entre programas inspirados nos regimes de Cuba e da URSS, de um lado, e a democracia que sucedeu a ditadura militar, de outro”. Finalmente, Mota afirmou que a Comissão irá “preencher lacunas de histórias familiares marcadas por assassinatos, torturas e desaparecimentos” ao longo do regime militar, mas que deveria também se dispor a “reconstituir as narrativas das vítimas da esquerda armada”, seja de militantes assassinados por colegas ou civis atingidos por atos terroristas. Em outra coluna opinativa da Folha, no dia 15/05/12, o jornalista Janio de Freitas alegou que a instauração da Comissão não deve ser recebida com muito otimismo, pois seus trabalhos são muito mais complexos e improváveis do que se supõe. Para Freitas, a confiança que está depositada na eficácia da Comissão supõe nela poderes capazes de enfim finalizarem todos os obstáculos presentes há mais de 25 anos, que são como uma “cortina de ferro à brasileira” e que talvez arquivos sejam descobertos e apurados e outros sejam entregues, porém, colaborações para fatos como a localização de corpos desaparecidos não serão facilmente obtidas. Ao valorizar a importância da escolha dos integrantes da Comissão, Freitas reconheceu que “não cabe dúvida alguma de que todos levam para a comissão seriedade e empenho no melhor grau”. Em editorial do jornal, no dia 16/05/12, destacou-se a entrada em vigor da Lei de Acesso à Informação e a posse dos membros da Comissão da Verdade. Em relação à primeira, a Folha destacou o despreparo das instituições em localizar e fornecer as informações a quem solicitar e, em relação à segunda, foi ressaltada a necessidade da Comissão “transcender o debate viciado sobre revanchismo e reforçar o valor dos fatos contra toda forma de obscurantismo”. Ressaltou-se a polêmica sobre a função dos trabalhos da Comissão, se devem abordar apenas crimes cometidos por militares ou também aqueles cometidos por organizações de esquerda. O jornal afirmou que a lei de criação da Comissão admite ambas investigações, mas, por outro lado, é injusta a equiparação das ações militares e dos grupos de esquerda, “seja por seu número, pelo emprego sistemático da tortura e de assassinatos por agentes do Estado ou pelo fato de militantes da esquerda já terem pago pelo erro com prisões, tortura e morte”. Em coluna opinativa do mesmo jornal, no dia 16/05/12, o jornalista Hélio Schwartsman  afirmou que os integrantes escolhidos por Rousseff para compor a Comissão da Verdade são bons por possuírem sólida reputação jurídica ou reconhecimento na defesa dos direitos humanos. Schwartsman apontou que a Comissão tem a função de contar uma história “na expectativa de que a narrativa possa funcionar como freio à violência do Estado”. Em decorrência da amplitude dos trabalhos a serem realizados, que devem analisar todas as “graves violações de direitos humanos”, de 1946 a 19888, é preciso que um foco seja estabelecido, e que este possivelmente será em relação aos crimes cometidos durante o regime militar. Diante disso, é necessário afastar ideias em que as partes (militares e militantes) sejam igualadas, pois “a situação não chegou nem perto da de um conflito civil em que os dois lados se enfrentavam em igualdade de condições”. O jornalista destacou ainda que mesmo que militantes tenham utilizado armas, deveriam ser considerados, por lei, criminosos comuns protegidos pelas garantias fundamentais das constituições de 1946 e 1967, e que os militares possuíam o dever de “respeitar os direitos dos presos e assegurar-lhes a integridade física”. Em coluna opinativa do dia 18/05/12, no jornal O Estado, o jornalista João Mellão Neto questionou a finalidade da Comissão da Verdade. Segundo Neto as primeiras declarações dos membros da Comissão demonstraram que muitos atritos ocorrerão entre eles, todavia a maioria permanecerá sem solução. Destacando também se os crimes dos militantes serão investigados afirmou que a solução é complicada, pois o movimento de esquerda foi responsável pela morte de cerca de 130 pessoas, a maioria transeuntes que se encontravam em locais de atentados e foram reconhecidos apenas como “acidente de percurso” pelos movimentos de esquerda. Para Neto a solução mais simples é pensar que “tudo que a esquerda faz é o bem; tudo o que a direita faz é o mal”, entretanto, para ele este discurso não é mais cabível após uma década da gestão do Partido dos Trabalhadores (PT) no Brasil. Para ilustrar este dilema maniqueísta, Neto relatou sobre a experiência de Hannah Arendt durante sua cobertura, como jornalista, do julgamento de Adolf Eichmann, em Israel, da qual surgiu o livro A Banalidade do Mal, e o massacre ocorrido na Ucrância pela União Soviética, chamado Kolomodor. Ao trazer exemplos de atrocidades cometidos tanto pelos movimentos de direita, quanto pelos de esquerda, Neto questionou qual a verdade que se está buscando, pois aqueles que realmente tiveram voz de comando dos fatos ocorridos durante o regime militar hoje estão com pelo menos 80 anos de idade e, segundo ele, dificilmente arrependidos dos crimes que cometeram, além de serem juridicamente inimputáveis.  A partir de suas indagações Neto conclui que a Comissão da Verdade não tem finalidade nenhuma a não ser reescrever a História do Brasil, pela ótica da esquerda. Ainda no jornal O Estado, a jornalista Dora Kramer, no dia 18/05/12, destacou que a cerimônia de nomeação dos membros da Comissão da Verdade foi uma festa bonita, sóbria e cheia de simbolismos, começando pela presença dos ex-presidentes da República, os quais tiveram papéis e significados diferentes durante a História do Brasil, além disso, houve o reconhecimento póstumo de Tancredo Neves e Itamar Franco, porém não houve menção aos ex-presidentes militares. Kramer  chamou a atenção para o fato de que a cerimônia festejava a democracia e que por isso mesmo não houve homenagens a “ditadores”, afirmando que o regime militar caracterizou-se pela supressão das liberdades e garantias constitucionais, portanto os governantes eram “tiranos”. A jornalista fez uma análise dos dois lados envolvidos, de um lado os militares que temem  a execração popular, exatamente no momento quem a nova geração de militares acredita que o poder político pertence à sociedade civil, e do outro as vítimas do Estado que não veem sentido em apurar os dois lados da história na Comissão. Para a colunista, se o objetivo da Comissão é realizar um levantamento de informações, sem julgamentos, não há razões para que não se apure os fatos por todos os prismas e assim, resgate-se a história completa do país. (Correio Braziliense – Opinião – 13/05/12; Folha de S. Paulo – Opinião – 12/05/12; Folha de S. Paulo – Opinião – 13/05/12; Folha de S. Paulo – Opinião – 14/05/12; Folha de S. Paulo – Poder – 15/05/12; Folha de S. Paulo – Opinião – 16/05/12; O Estado de S. Paulo – Opinião – 13/05/12; O Estado de S. Paulo – Espaço Aberto – 18/05/12; O Estado de S. Paulo – Nacional – 18/05/12)

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