Em coluna opinativa
para o jornal O Estado de S. Paulo, o escritor Marcelo Rubens Paiva afirmou que
o governo dos Estados Unidos disponibilizou ao governo brasileiro 538
documentos relacionados ao regime militar no Brasil (1964-1985). Dentre os
documentos, porém, não foram entregues arquivos relacionados a Henry Kissinger,
que na época ocupou cargos como conselheiro de Segurança Nacional e secretário
de Estado dos Estados Unidos. Segundo o colunista, Kissinger apoiou regimes
autoritários da época e impulsionou golpes no Chile, no Uruguai e na Argentina,
além de colaborar com uma rede de “espiões e assassinos” responsáveis pela
morte de líderes democratas. Paiva ressaltou que, por volta do ano de 1976,
quando Jimmy Carter foi eleito para a presidência dos Estados Unidos e passou a
reformular a política externa do país ao pressionar os regimes
latino-americanos que cometiam violações aos direitos humanos, morreram de
forma suspeita diversos políticos brasileiros. Dentre estes, destacou os
ex-presidentes da República Juscelino Kubitschek e João Goulart, além do
político Carlos Lacerda. O colunista destacou ainda as mortes do ex-presidente
boliviano Juan José Torres, do ex-ministro chileno Orlando Letelier, do
ex-presidente da Câmara dos Deputados do Uruguai Héctor Ruiz, do ex-senador
uruguaio Zelmar Michelini e do ex-comandante do exército chileno Carlos Prats.
A respeito da morte de Kubitschek, o colunista lembrou que o ex-presidente
morreu em estrada próxima à Academia Militar das Agulhas Negras, após refeição
no hotel-fazenda do então brigadeiro Newton Villa-Forte – o qual era amigo
próximo do general Golbery do Couto e Silva. O veículo no qual viajava
Kubitschek atravessou um canteiro na estrada e colidiu com outro veículo. Um
motorista que presenciou o acidente afirmou que o motorista do carro que
transportava o ex-presidente, Geraldo Ribeiro, já estava morto antes da
colisão. Segundo o colunista, Ribeiro havia notado, ainda no hotel, que a
suspensão do carro fora alterada. De acordo com Rubens Paiva, testemunhas do
acidente afirmaram que o carro passou por um ônibus da Viação Cometa já com a
roda dianteira e a suspensão quebradas. Em relação à morte de Goulart, o
colunista relatou que o ex-presidente sofria de problemas cardíacos e morreu na
Argentina, apesar de ter sido examinado meses antes para constatar que estava
em boas condições de saúde. Existe a hipótese de que João Goulart tenha sido
envenenado de forma semelhante ao poeta Pablo Neruda, intoxicado durante o
regime militar chileno, cuja morte é atribuída ao agente da Agência Central de
Inteligência estadunidense (CIA) Michael Townley, o qual serviu a diretoria de
inteligência do Chile. Segundo Rubens Paiva, um ex-agente do serviço de
inteligência uruguaio, Mario Neira Barreiro, que seguiu Goulart durante quatro
anos, afirmou que o ex-presidente brasileiro foi vítima de uma operação
financiada pela CIA para que fosse envenenado através dos remédios que tomava
regularmente. Contudo, a informação não foi provada. Por fim, Paiva afirmou que
a morte de Lacerda deu-se por septicemia generalizada e havia a suspeita de que
o político havia se infectado ao cuidar de rosas. Há, porém, a suspeita de que
tenha sido envenenado por potássio. O colunista destacou que Carlos Heitor Cony
e Anna Lee escreveram um livro, intitulado O Beijo da Morte, no qual relatam o
encontro entre Goulart e Lacerda, em 1967, no Uruguai, com procuração de
Kubitschek, no qual discutiram a formação de uma Frente Ampla. Segundo Paiva,
“a vitória do MDB (partido de oposição), o movimento social pela
redemocratização e anistia, pressões da Igreja e de Jimmy Carter eram uma
ameaça ao projeto militar brasileiro. Uma carta encontrada casualmente de 25 de
agosto de 1976 confirma as suspeitas”. Segundo o colunista, na carta
mencionada, o coronel da inteligência chilena Manuel Contreras respondia ao
general brasileiro João Figueiredo que compartilhava a preocupação de que
Kubitschek e Letelier poderiam causar instabilidade nos planos para a região, e
informava que apoiaria o plano “contra certas autoridades”. Ademais, o
colunista afirmou que estava em andamento um plano, revelado pelo jornalista
Richard Gott, para eliminar personalidades que apoiavam a volta da democracia:
“a Operação Condor lembrava a Operação Fênix, programa de assassinatos de
lideranças financiado pela CIA contra aqueles ‘capazes de agrupar o povo numa
campanha de resistência contra militares no poder’”. Segundo Paiva, Kissinger
foi responsabilizado pelas operações e mereceria ser convocado. (O Estado de S.
Paulo – Caderno 2 – 01/08/15)
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