quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Comandante do Exército concedeu entrevista a periódico

Em entrevista ao periódico Correio Braziliense, o Comandante do Exército, general Eduardo Dias da Costa Villas Bôas, afirmou que, se essa situação permanecer, as empresas envolvidas em projetos estratégicos, como o do blindado Guarani, não terão condições de mantê-los. O risco imediato é que com o ritmo dos cortes do orçamento, o ciclo de implantação já estará obsoleto antes de ser concluído. O Comandante atribui a dificuldade no corte orçamentário à crise econômica no país, pois o Exército tem consciência da realidade das pessoas, tendo a Força passado um tempo no conjunto de favelas da Maré, na cidade do Rio de Janeiro. Porém, considerou Villas Bôas que o Ministério da Defesa fez um bom trabalho no processo de negociação do orçamento, pois foi um trabalho intenso e consistente que conseguiu preservar programas, apesar dos problemas econômicos. O general declarou ainda que o Exército atravessou 30 anos de penúria orçamentária e, com isso, adaptou-se, mas que perdeu capacidade de pensar estrategicamente, em longo prazo. Essa série orçamentária declinante, de acordo com Villas Bôas, reverteu-se com o governo do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva e o marco foi quando pediu ao então ministro da Defesa, Nelson Jobim, que colocasse a defesa na pauta de discussão nacional. Jobim, juntamente com o ministro-chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger, elaborou uma Estratégia Nacional de Defesa (END), pois “pela primeira vez, o poder político disse aos militares qual era a concepção de Forças Armadas, o que entendiam como necessário para o Brasil”. O Comandante ressaltou que os recursos das Forças Armadas devem ter previsibilidade e regularidade e outra mudança importante diz respeito aos projetos estratégicos. Ademais, com a END foi possível fazer uma reestruturação interna do Exército para gerenciar sete projetos estratégicos. Essa reestruturação, segundo Villas Bôas, iniciou-se quando, após a Organização das Nações Unidas (ONU) solicitar ao Brasil que dobrasse seu efetivo na Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (Minustah), no ano de 2010, por ocasião do terremoto naquele país, custou três semanas para o Exército conseguir reunir um batalhão para enviar àquele país. O general considerou tal fato inaceitável, pois a capacidade de mobilização deveria ser de 24 ou 48 horas. Com respeito à presença do Brasil no Conselho de Segurança da ONU, Villas Bôas afirmou que um país que pretende atingir o patamar de liderança regional e de membro permanente do conselho, precisa “ter capacidade de fazer o que se chama de projeção de poder”, ou seja, é preciso ter presença política, econômica e diplomática, capacidade de influência, tendo o respaldo de uma capacidade de presença militar, o que pressupõe projeções de força. Para o Comandante, com as projeções que se tem no cenário atual, tudo o que foi concebido estará obsoleto antes de 2035. Declarou ainda que o Brasil, em pleno século 21, possui metade de seu território não ocupado, integrado ou articulado, com a população não tendo infraestrutura social e econômica para atender suas necessidades e a única capacidade para tal está nas Forças Armadas, exigindo sua presença espalhada pelo território. Assim, há dificuldades em adquirir qualidade, mas manter a quantidade. Com relação ao emprego das Forças Armadas em funções sociais, Villas Bôas declarou que existe um polo que defende que o Exército e as Forças Armadas devem destinar-se apenas à defesa do país e outro que defende que “o Exército virou uma empresa de prestação de serviços”. Porém, de acordo com o general, “o que se vê na tendência mundial é que as Forças Armadas têm de estar em condições de atender às demandas da população”. Sobre a questão dos salários no Exército, Villas Bôas considerou este um problema grave, pois a redução dos recursos para pagamento de pessoal nas Forças Armadas foi maior do que em outros setores, e isso aumenta a frustração interna, intensificando a evasão para os setores de mercado, como as áreas técnicas, de engenharia e saúde. Em relação ao problema do narcotráfico, Villas Bôas afirmou que o considera como a maior ameaça à segurança do país, pois o Brasil possui uma fronteira de quase 17 mil quilômetros e um país vizinho que é produtor de cocaína e maconha. O comandante declarou ainda que o Exército está muito preocupado pela iminência de que o Brasil se torne também produtor de cocaína, “porque isso altera nossa posição, juridicamente, no ambiente internacional”. Sobre o narcotráfico na Amazônia, o general afirmou que este ainda é pouco organizado, mas que as grandes organizações criminosas de São Paulo e Rio de Janeiro estão chegando à região, uma vez que na fronteira com os países vizinhos já se detectou a presença de cartéis internacionais, com caráter violento e grande capacidade de contaminação de instituições. Além disso, afirmou que junto ao problema das drogas há o das armas, considerando-o uma questão que está se agravando, estando o crime organizado em poder de armas cada vez mais sofisticadas e potentes. Quando questionado a respeito da preocupação do Exército com a crise política no Brasil, o general declarou que há uma atenção da corporação, mas que a instituição cumprirá o que a Constituição estabelece, pois o Brasil possui instituições muito bem estruturadas e sólidas, que cumprem suas tarefas, dispensando a sociedade de ser tutelada. Sobre as manifestações que defendem a intervenção militar, afirmou que “estamos preocupados em definirmos para nós a manutenção da estabilidade, mantendo equidistância de todos os atores”. Segundo Villas Bôas, o Exército é uma instituição de Estado e não pode se permitir a um descuido e provocar instabilidade. O segundo fator é a legalidade, ou o respaldo pelas normas em todos os níveis, e o terceiro, a legitimidade, que o Exército possui por atuar apenas na legalidade e dessa legitimidade vem da coesão do Exército que, com isso, cumpre bem seu papel. Ademais, o Comandante afirmou que não há nenhuma possibilidade de os militares virem a tomar o poder novamente no Brasil, pois o que os baliza é o que está na Constituição, e declarou que não há ameaça de ruptura institucional no país. Com relação à defesa cibernética, Villas Bôas considera esta uma área extremamente preocupante e “é um processo que tem de estar em permanente evolução”. Por fim, o general considerou que corre-se o risco de uma nova Guerra Fria, porém numa confrontação de caráter econômico, cuja ferramenta é  a questão ambiental, onde deixa-se tomar por um pensamento politicamente correto que impede que aflorem soluções concretas para os problemas do país. Assim, para o Comandante, é preciso ter o mínimo de pragmatismo para voltar a construir o país, pois além de não haver um sentido de projeto, deixou-se dominar pelo pensamento politicamente correto que dificulta, por exemplo, o combate à criminalidade no Brasil. Deste modo, considera que o erro do politicamente correto é, por um lado, a presunção de que o criminoso é, de alguma forma, sempre uma vítima da sociedade, e por outro, é que se perdeu muito a disciplina social, ou seja, o conceito de autoridade presumida que tem um professor quando entra na sala de aula, por exemplo. Segundo Villas Bôas, “a presença do professor deveria estabelecer, automaticamente, regras de comportamento para que o funcionamento da sala de aula se viabilizasse” e a isso atribui o fato das pessoas pedirem a volta do Exército ao poder. (Correio Braziliense – Política – 27/09/2015)


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